O Sul-Americano Sub-20, que terá início hoje e irá até o próximo dia 12 de fevereiro, tendo como sedes as cidades peruanas de Arequipa, Tacna e Moquegua, não apenas irá distribuir quatro vagas para o próximo Mundial da categoria, a ser disputado ainda este ano na Colômbia, e duas para as Olimpíadas de Londres, no ano que vem, mas também tem tudo para ser um marco na definitiva escalada dos clubes europeus na busca por talentos aqui na América do Sul.
E os motivos são vários, mas fundamentalmente três são os principais: a grave crise econômica que ainda assola a Europa, a futura adoção do Fair Play Financeiro (FPF) por parte da UEFA daqui a três temporadas e o grande sucesso que alguns dos destaques das edições anteriores do torneio estão tendo no futebol europeu.
A crise vem fazendo com que o valor dos direitos federativos dos atletas na Europa, mesmo o daqueles de ponta, venha paulatinamente caindo. Mas nem com esse incentivo a atual janela de transferências ficou mais movimentada.
Um exemplo claro é o talentoso uruguaio Luis Suárez, atacante do Ajax e um dos destaques da Copa passada. Na última janela, entre julho e agosto do ano passado, os Godenzonen pediam a “bagatela” de € 35 milhões pelos direitos de seu atleta. Hoje, esse valor já foi reduzido em € 15 milhões.
E mesmo assim o negócio não sai. O Ajax precisa do dinheiro, mas os interessados estão esperando o final deste mês, quando acreditam que poderão bater o martelo por um preço ainda menor.
FPF - Esse comportamento prudente como nunca antes visto por parte das equipes da Europa em uma janela de mercado tem outra razão de ser: a futura adoção do Fair Play Financeiro. O FPF é a mais séria tentativa de salvar o futebol europeu da falência financeira. A ação tem como responsável Jean-Luc Dehaene, que foi primeiro-ministro da Bélgica entre 1992 e 1999 e comanda um grupo de especialistas em leis e finanças, ao qual caberá auditar os clubes europeus.
O FPF, de maneira bastante resumida, permitirá que os clubes apresentem déficit de até € 45 milhões no primeiro triênio de adoção da medida (2013 - 2016), e de € 30 milhões nos triênios restantes. Ao romper essa barreira, a UEFA irá negar a inscrição do clube em qualquer competição europeia.
E os torneios interclubes que a UEFA realiza, principalmente a Champions League (CL), são verdadeiras minas de ouro para as equipes europeias. A falta de uma competição desse porte na agenda de um clube, principalmente dos grandes, causa seríssimos transtornos financeiros.
Apesar da iniciativa da UEFA ter início formal apenas na temporada 2013/2014, atualmente os balanços anuais dos clubes já são enviados para a entidade.
Apenas para ilustrar o desequilíbrio nas contas de alguns dos principais clubes europeus, uma empresa italiana de auditoria, a MF-Milano Finanza, publicou na semana passada um estudo que identificou aqueles com situação mais complicada.
Caso a medida entrasse em vigor na próxima temporada, gigantes como Milan, déficit de quase € 96 milhões nos dois últimos exercícios, e Barcelona, € 88 milhões, não poderiam disputar a mais nobre competição interclubes do planeta bola.
Mas quem está em pior situação - dramática, para utilizar um adjetivo mais apropriado - em todo o continente é a atual campeão da CL, a Internazionale. O clube da Lombardia apresentou “modestíssimo” rombo de € 223 milhões nos últimos dois exercícios.
E aqui tenho que dizer que ao ver esse número a torcida do Milan quase chora... de tanto rir! E inacreditável pensar que os caras vão acabar como as principais vítimas do Calciopoli, golpe criado por eles mesmos em 2006 para que a interminável sequência de fracassos da equipe nerazzurra tivesse fim. Mas essa é outra conversa.
Mudança de paradigma - Com pouco dinheiro em caixa atualmente, e com cuidado redobrado na hora de gastar para não comprometer os balanços futuros, os clubes europeus vêm paulatinamente investindo cada vez mais na base.
E esse comportamento vem criando uma verdadeira bolha de especulação em torno de alguns nomes. A esmagadora maioria deles de completos desconhecidos mesmo para o mais fanático torcedor.
Aqui no Brasil o mais famoso caso é o do atacante Lucas Piazon, do Sub-17 do São Paulo. Um desconhecido em terras tupiniquins até para o mais fanático torcedor tricolor, o atleta é uma verdadeira febre entre os cartolas europeus.
A edição da Gazzetta dello Sport da última quarta-feira dava conta que uma proposta oficial da Juventus (ITA) pelo atleta havia sido recusada pelo clube do Morumbi. E ela era de € 6,5 milhões.
O São Paulo, de acordo com o periódico italiano, achou pouca a oferta, pois crê que seu atleta valha pelo menos € 3,5 milhões a mais. E isso sem ainda ter sequer disputado a Copa São Paulo, pois Piazon só completará 17 anos no mês que vem, o que impediu que o São Paulo fizesse sua inscrição no torneio - o clube do Morumbi tem por política não inscrever jogadores com menos de 17 anos no torneio, embora o regulamento permita.
A mesma matéria dava conta que a fila de interessados no futebol do jovem jogador do São Paulo é enorme. Milan, Inter, Barça, Real Madri e Chelsea são os pretendentes mais ilustres.
América do Sul - Esse é apenas um indício para mostrar o tamanho do interesse dos gigantes da Europa por novos jogadores - que em tese seriam mais baratos.
É nesse contexto que está inserido o Sul-Americano que começa hoje e que tem a Argentina como equipe a ser batida.
Vindos de um fracasso histórico no último torneio da modalidade - ficaram apenas em quinto lugar no Sul-Americano de 2009 -, os argentinos contam com uma equipe tão boa que se deram ao luxo de deixar seu melhor jogador, o talentoso meia Erik Lamela (River Plate), que acima aparece em foto do site Academia de Talentos, de fora da competição.
Para Lamela, que conta com apenas 20 jogos na equipe profissional em seu currículo e é uma dessas carreiras meteóricas do futebol de hoje, talvez tenha sido até melhor ficar fora da competição. Daniel Passarela, que aqui no Brasil ficou conhecido por ter sido o primeiro treinador escolhido por Kia Joorabchian para dirigir o Corinthians durante a gestão MSI, atualmente é presidente do River Plate e já tem em sua mesa uma proposta oficial do Milan pelo jovem astro do elenco “Millionario”.
Os jornais argentinos (Clarín e Olé) dizem que ela é de € 12 milhões. Os periódicos italianos especulam com a metade disso. O fato concreto é que, independentemente do valor, o jovem atleta, por conta da gravíssima crise financeira que assola os clubes argentinos, dificilmente deixará de desembarcar em Malpensa no próximo mês de julho.
Esse cenário só não irá ocorrer se daqui até o final deste mês acontecer um leilão por seus direitos entre as grandes potências do futebol mundial - coisa que Passarela está tentando criar de maneira quase declarada. O River precisa de dinheiro urgentemente para poder equilibrar minimamente suas finanças e isso só vai ocorrer quando negociar suas jovens estrelas.
Entre os atletas presentes no elenco albiceleste no Peru, destaque para o zagueiro Leonel Galeano (Independiente), titular na conquista da última Copa Sul-Americana em cima do Goiás, para os atacantes Sergio Araujo (Boca Juniors), Juan Iturbe (Cerro Porteño), Rogelio Funes Mori (River Plate) e para o meio-campista Bruno Zuculini (Racing).
Outra seleção que merece destaque é o Uruguai. E a “Celeste Olímpica” também estará desfalcada de seu melhor jogador da categoria, pois a Lazio não liberou Gonzalo Barreto para a competição.
Os uruguaios, no entanto, poderão contar com Diego Polenta (Genoa), que parece ser um zagueiro de boas qualidades. Eventualmente ele é aproveitado também como lateral na equipe Primavera do clube grifone.
Destaque também para o atacante Federico Rodriguez (Peñarol). Rodriguez, Zuculini, Funes Mori e Sergio Araujo são cobiçados por praticamente todos os grandes clubes da Europa.
Sucesso - E essa cobiça não é por nada. Os destaques do Sul-Americano retrasado que tomaram o rumo da Europa, como o uruguaio Cavani, artilheiro daquela competição e hoje no Napoli, e Pato, destaque absoluto daquele torneio e hoje no Milan, atualmente são estrelas do futebol europeu e movimentam milhões de euros anualmente.
Outro jogador que foi ainda mais cedo para a Europa, antes mesmo de poder disputar qualquer torneio Sub-20 por aqui, o chileno Alexis Sanchez, é tratado como joia absoluta do elenco da Udinese.
Assim, por conta da interminável crise e com os destaques aqui da América do Sul mostrando valor rapidamente e conseguindo afirmação em clubes importantes do futebol europeu, não será nenhuma surpresa se algum dos jogadores da atual edição do torneio for negociado ainda nesta janela de transferências.
